Os carros mais feios do mundo
Os carros mais feios do mundo
Por Edu Pincigher
Vivíamos em outro planeta algumas décadas atrás. Veja o caso da imprensa automotiva. Sem as facilidades que surgiram com a internet, o volume de produção de conteúdo era irrisório quando comparado ao que você recebe hoje em seu smartphone ou na tela do computador. Descobrir o que estava acontecendo no mundo do automóvel era uma tarefa das mais árduas frente ao que se vê atualmente.
Trabalhei em duas revistas nos anos 90: Quatro Rodas e Motor Show. Na primeira delas, eu fazia dois ou três testes/reportagens por mês. Hoje um bom repórter produz meia dúzia de artigos… por dia. Não que fôssemos lenientes frente à agilidade das novas gerações. Ocorre que tínhamos muito menos fontes para levantar dados, checar informações e desvendar novas histórias. Você investigava muito antes de ter material jornalisticamente apurado para consolidar uma reportagem.
Como as importações haviam acabado de reabrir no país, uma das formas de se atualizar era a leitura obrigatória de algumas das principais revistas estrangeiras. O que surgia na Alemanha logo vinha para o Brasil. Na França, na Itália, nos Estados Unidos também. Eu gostava muito da italiana Quattroruote e da norte-americana Road & Track. Fuço nos sites das duas até hoje. E “olhava as figuras” da alemã Auto Motor und Sport.
Outra fonte de atualização consistia no que as próprias montadoras espontaneamente informavam, incluindo alguns de seus lançamentos internacionais. Também dava para descobrir as novidades quando íamos aos salões do automóvel de fora do país.
Alguns desses recursos ainda são usados hoje, como os chamados press releases, que são os comunicados que as próprias empresas fazem para informar sobre seus lançamentos. O jornalista recebe e, se entender que é uma notícia relevante, publica organicamente. Já salões do automóvel, na minha opinião, são totalmente ineficazes, embora haja quem acredite que a exibição estática de novos produtos, sem proporcionar experiência ao consumidor, consiga cativar o consumidor do século 21.
Pensando bem… como tem gente que ainda enxerga o Opala, 33 anos post mortem, como um carro rápido e dinâmico até hoje (!!), achar que salão ainda funciona talvez nem pareça tão esdrúxulo, não é mesmo?
Aqui é o momento em que o colunista é achincalhado. Mas reafirma sua tese. Nem salão e nem Opala.
Onde entram os carros mais feios?
Por que fiz esse introito tão longo, visto que o título da coluna aborda os carros mais feios do mundo? Lá na Motor Show, no final dos anos 90, eu tinha o constante hábito de usar meu tempo livre para “estudar” um livro enorme, de mais de 500 páginas, anual, que se chamava Tutto le Auto del Mondo. Ele continha cerca de 2,5 mil carros produzidos em todo o planeta e era editado pela equipe de Quattroruote. Havia um outro, editado na Suíça, que abordava o mesmo conteúdo: Automobil Revue. Esse último, eu nem lembrava o nome quando redigia essa coluna – o Bob Sharp me salvou.
Foi assim que descobri outras marcas russas além da Lada, como a ZAZ e a Volga; que a Índia tinha duas montadoras locais (Mahindra e Hindustan) e que a Austrália abrigava uma marca nacional chamada Holden, que pertencia ao Grupo GM. Foi ela que enviou pra cá o “Omega australiano”, aquele de motor 3.8 V6, na virada dos anos 2000. Juro que tô puxando esses exemplos pela memória.
Esses anuários eram sensacionais. Eu me divertia ao folheá-los, procurando conhecer famílias de veículos de marcas premium, curiosidade legítima para quem queria cavar pautas para informar os leitores brasileiros. Eu estudava a ficha técnica e procurava sacar alguma nova tecnologia para bolar temas de interesse aos leitores. As fichas também serviam de base para os testes dos primeiros carros que vinham de fora, visto que boa parte dos importadores não tinha muitas referências técnicas sobre os produtos.
Descobri o Mazda RX-7, com motor Wankel, lendo esses livros. Tempos depois ele desembarcou no Brasil e eu já o “conhecia”, pelo menos por fotos e pelos dados técnicos. Lembro, por exemplo, que usei esse livro para ganhar alguma cultura automotiva sobre a Audi, quando fiz o teste do primeiro modelo, um S4, ainda trabalhando na Quatro Rodas, que desembarcou no Brasil com a Senna Import em 1994.
Os carros eram reflexos dos respectivos países
Aquele era um mundo com um acentuado teor regionalista. Havia produtos muito particulares, feitos especificamente para cada país e, no máximo, seus vizinhos próximos. Ninguém fazia carros subcompactos tão competentes, por exemplo, como os italianos e os japoneses. E bastava você pensar nos congestionamentos – e na largura das vias – de Roma e Tóquio para entender o porquê.
Já o design dos carros franceses exprimia o gosto de uma nação acostumada às excentricidades do Art Nouveau da arquitetura parisiense. Paris é uma cidade linda. Tudo lá combina e cada esquina é um cartão postal. Mas os carros de Renault, Peugeot e Citroën dos anos 90 não eram nada bonitos. Longe disso.
Você olhava modelos da Buick, Oldsmobile, Pontiac, Lincoln (…) e concluía que aquilo só cabia mesmo no mercado norte-americano, com gasolina a US$ 0,50 por galão – o equivalente hoje a menos de R$ 1 por litro. Eram carros que retratavam o american way of life, com design bem particular (para ser generoso), muito espaço interno, suspensão amanteigada e o orgulho indiscriminado de despejar CO2 pelo escape.
There is no substitute for cubic inches. Era o lema dos caras.
Do mesmo modo, carros russos expressavam o contexto sociopolítico do que havia sido a extinta União Soviética até os anos 80: espartanos, duros, firmes, frios. Tinham design até belicista: “quanto mais quadrado, melhor”. Pareciam carros prestes a comer criancinhas…rs. Mas eram robustos e aparentemente duráveis.
Não havia globalização. A GM até havia criado o Projeto J, seu primeiro carro global, nos anos 80, que virou Opel e Vauxhall Ascona na Europa, Chevrolet Cavalier (mais algumas variações da Pontiac) nos EUA, Isuzu Aska no Japão e Monza no Brasil. As reestilizações, nos anos seguintes, seguiram por rumos diferentes.
Eu formei parte da minha cultura automotiva por muitos anos com o auxílio dos livrões italiano e suíço.
E o que isso, finalmente, tem a ver com os carros mais feios do mundo? Explico: fizemos na Motor Show, uma vez, compilando alguns exemplos marcantes desses livros, uma seleção de fotos de beldades automotivas (o termo ‘beldades’ contém ironia) que virou uma reportagem.
Lembro de alguns: Hyundai Tiburon, Ssangyong Korando, Opel Agila (não confunda com Chevrolet Agile, se bem que era feio também…) e Fiat Multipla, só para ficar em marcas conhecidas. E o campeão mundial de bizarrice de todos os tempos: Pontiac Aztek. Dá um Google e se prepare para tomar um susto.
E hoje, quais seriam eles?
E é isso, com as incríveis facilidades da internet, que eu te convido a me ajudar para uma das próximas colunas: quais os carros mais feios do mundo hoje? Me manda as suas opiniões? Ajude-me a fuçar bons exemplos espalhados pelo mundo que mereçam essa distinção? Farei um ranking dos mais votados e retorno, daqui a algumas semanas, com o resultado.
Para ampliar a base, vamos pegar carros feitos de 2023 pra cá. É legal, porque dá pra incluir Toyota Etios e Mitsubishi Eclipse Cross. Esse é o segundo momento em que o colunista é xingado, desta vez pelos defensores do compacto da Toyota. Mas me xinga menos e me ajuda mais: quais os carros mais feios do mundo na sua opinião?