Kart

A História de uma Mania

 

 

Em 1959 nascia o primeiro kart, um brinquedo que iria mudar a história do automobilismo brasileiro.

Final da década de 50, mais precisamente 1959. A Europa se preparava para receber os Beatles e os Rolling Stones. Enquanto isso, no Brasil, longe da Europa e do Rock’n Roll, começava a surgir uma brincadeira que em pouco tempo se tornaria a escola dos maiores nomes do automobilismo brasileiro.
Entusiasmado com as corridas que assistiu nos EUA, com pequenos carrinhos de motores dois tempos, o comerciante de automóveis Cláudio Daniel Rodrigues resolveu “importar” a idéia, fabricando os primeiros chassis de kart do Brasil. Em uma época onde o improviso falava mais alto que a tecnológia, o protótipo do kart nacional tinha pneus de carrinho de mão e motor de bomba d’água. “O Cláudio nos procurou porque nós éramos a única fábrica que produzia um motor dois tempos. Tivemos de adápta-lo, pois nosso modelo era mais utilizado em pequenas embarcações”, lembra Mário de Carvalho, hoje proprietário da mecânica Riomar. O Idealismo que marcou os primeiros anos no novo esporta era movido principalmente pelo prazer das disputas de rua, na capital e no interior.
Segundo o ex-piloto o kart era uma forma de fazer amigos. ” Nós corríamos pelo puro prazer da competição.”, comenta Figueiredo. “Hoje, em dia, o garoto já senta no kart pela primeira vez com o objetivo de uma dia chegar na F1”, compara. A Verdade é que a primeira geração de kartistas brasileiros vivenciou uma época muito mais “romântica” no esporte.
Os próprios pilotos faziam as vezes de mecânico e chefe-de-equipe, preparando o kart antes de entrar na pista.
Para um país que, apesar de já possuir nomes de destaque como Chico Landi, ainda não vivia da tradição de títulos mundiais, os novos pilotos que surgiam eram quase sempre incentivados por amigos, parentes ou pela curiosidade despertada por aqueles carrinhos.
O próprio Carol revela a maneira um tanto inusitada que o levou ás pistas. “Em sociedade com um amigo, comprei um kart a prestação no Mappin, Depois como meu sócio era muito pesado, fiquei sendo o piloto, enquanto ele era o chefe-de-equipe”. E foi assim, a bordo de um kart de brinquedo, comprado em um magazine, que este ex-cavaleiro trocou o hipismo pelas corridas, tornar-se um dos maiores pilotos de sua época, tendo inclusive conquistado um título sul-americano.
Evolução Constante
Várias experiências eram feitas para melhorar o desempenho dos karts. Os primeiros modelos eram muito diferentes dos atuais. “A gente pilotava quase deitado”, relembra Carol. Os chassis construídos na época eram inspirados nos modelos americanos, mais apropriados para provas de longa duração. Mário de Carvalho explica que somente após a inauguração do kartódromo de Interlagos os chassis passaram a seguir o padrão europeu. “Diminuiu a distância entre-eixos e os pilotos já não dirigiam tão deitados”, acrescenta Mário, lembrando ainda que a esta época seu principal parceiro na construção de chassis era o jovem Emerson Fittipaldi, um dos primeiros pilotos a conseguir competir com menos de 18 anos, já que era preciso ter a carteira de habilitação para poder correr num simples kart.
O Surgimento das primeiras pistas foi forçando o aperfeiçoamento de pneus e chassis. Enquanto nas pistas improvisadas na rua as curvas são feitas praticamente em 90 graus, um circuito como o de Interlagos oferece uma grande variedade de traçados, tangentes, zebras e outras dificuldades que exigem um equipamento mais acertado para poder ser rápido. Em busca da aderência, a cada ano eram lançados novos chassis e uma série de compostos de borracha para os pneus…
Disputas Acirradas
Desde o ínicio das provas de kart no Brasil, a competitividade marcou a categoria. Nomes como Wilsinho Fittipaldi, Carol Figueiredo, Maneco Cambacau, Afonso Giaffone e José Carlos Pace, entre outros, se destacavam nas provas de rua. Emerson Fittipaldi também se tornou rapidamente vencedor no kartismo. “O Emmo era um piloto quase completo que sabia ouvir o motor como poucos.”, elogia Mário de Carvalho. “ouvir o motor”, na gíria dos kartódromos, é saber a hora exata de regular a entrada de combustível no motor, por meio das agulhas do carburador. Por isso, os pilotos de kart costumam ficar boa parte da volta com apenas uma mão no volante. A outra é usada para “carburar” o motor, ou seja, mexer nas agulhas de alta e baixa do carburador.
O Kartismo também ia ganhando impulso fora de São Paulo, Carol destaca um piloto gaúcho, Clóvis Moraes, que era um dos melhores do Brasil em sua época. “Era uma grande alegria nas provas em que eu conseguia derrota-lo sem que ele enfrentasse problemas mecânicos”. Ainda hoje o Rio Grande do Sul é a segunda força do kartismo nacional, acompanhado do Paraná, um dos que mais cresce no esporte.
Surge um garoto chamado Ayrton Senna
Com o final da década de 60, alguns dos principais pioneiros deixaram o kart, a maioria para correr de automóvel no Brasil, e outros, como Emerson Fittipaldi, foram para a Inglaterra, iniciar sua carreira na F-Ford. Já no ínicio dos anos 70 surgiam mais nomes que posteriormente teriam uma carreira de destaque na Europa, como Nelson Piquet, Roberto Pupo Moreno e Chico Serra. Aos poucos, o kart ia se firmando como uma verdadeira escola dos pilotos de competição, formando uma longa lista de jovens talentos que eram revelados anos após anos.
O Kartódromo de Interlagos viu crescer ainda na década de 70 um de seus maiores pilotos em todos os tempos. Ayrton Senna da Silva era então apenas mais um garoto de talento, mas que insistia em treinar quase diariamente e cultivava, já nos tempos de kart, uma incurável obsessão pela vitória.
“O Ayrton tinha algo especial, era preciso muito empenho para enfrenta-lo.”, desabafa Mário de Carvalho, cujo filho, Mário Sérgio, foi um dos maiores rivais de Senna nos tempos de kart. Outro forte adversário de Senna foi Walter Travaglini. No kart, Senna conquistou todos os títulos regionais, nacionais, além dos torneio sul e pan-americano. Só faltou ao seu currículo a conquista do Mundial de Kart, onde duas vezes sagrou-se vice-campeão. O mais importante é que, em todos os momentos de sua carreira, o tricampeão mundial não se cansava de exaltar o kart como o carro de corrida que mais lhe deu prazeres e alegrias. Não é a toa que, mesmo quando ja competia na F1, Senna costumava andar de kart com frequência, e chegou a construir um kartódromo com infra-estrutura completa na fazenda da familia em Tatuí, interior de São Paulo.

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